segunda-feira, 22 de maio de 2017

PÃO SOURDOUGH DE TRIGO INTEGRAL E CENTEIO

Um pão de mistura com as farinhas mais comuns, para pão, em Portugal: trigo, trigo integral e centeio. Embora se use também farinha de milho, típica, claro está, na broa de milho, não temos grande hábito em usar a farinha de milho na panificação. México e EUA usam bastante a farinha de milho, quer em tortillas quer em cornbread como estes pequenos pães em formato de Espigas de milho. Eu sempre adorei milho, em grão ou em preparados com a farinha mais grosseira (sémola ou carolo) ou mais fina, ver milho.

Este pão, para além de celebrar a vida, claro está, traz-me recordações, não do pão em sim, mas do que o rodeia.
Celebra a quinta-feira de Ascenção (3+40 dias depois da Páscoa) e o Dia da Espiga, onde tenho recordações de colher um ramo de diferentes plantas (que incluía papoila, alecrim, oliveira, espiga de trigo...) e de fazermos um piquenique. Celebra ainda o feriado municipal de Leiria, já que as farinhas usadas foram moídas nas mós do moinho de papel de Leiria. O Moinho de Papel, de 1411 por Carta Régia de D. João I, foi o primeiro moinho de papel conhecido em Portugal e a primeira fábrica da cidade, no qual se fabricaram as primeiras folhas à base de celulose. É, atualmente, um espaço museológico, ligado à aprendizagem de artes e ofícios tradicionais relacionados com o papel e o cereal e resulta de um projeto de recuperação e reabilitação levado a cabo por uma equipa multidisciplinar, onde se inclui Siza Vieira, com o objetivo de preservar a memória de artes e ofícios tradicionais inerentes a este património sociocultural, nomeadamente a moagem do cereal (milho, trigo e centeio), o fabrico do azeite e a produção do papel.
Para mim este moinho tem muito mais história, traz-me à lembrança o meu pai e as vezes que lá íamos comprar farinha, feijão, azeite... Lembro-me do que é hoje a sala das mós, toda bonita e cheia de luz, como uma divisão muito escura, cheia de teias de aranha, alfaias agrícolas e farinha por todo o lado. Já lá vão mais de 30 anos...

Certo é, que as farinhas moídas no momento deram a este pão um sabor adocicado com notas de amêndoa e avelã, muito delicioso. Não resisti ao tirá-lo do forno, a partir um pouco com a mão e comer com manteiga, claro está!
Feito com fermento natural em vez de fermento biológico (padeiro), é em tudo semelhante ao Pão Sourdough de trigo, trigo integral e centeio, mas as proporções das farinhas foram outras, usei mais farinha de trigo integral e centeio que trigo branco.

Como pão que é, acompanha qualquer coisa, mas gosto sobretudo de o comer com queijo fresco ou barrado com manteiga de amêndoa.

Fiz assim...

PÃO SOURDOUGH DE TRIGO INTEGRAL E CENTEIO


INGREDIENTES
300g de fermento natural (sourdough)
360ml de água
10g de sal
200g de farinha de centeio integral (T170)
350g de farinha de trigo integral (T150)
50g de farinha de trigo (T65)

Proporções do padeiro:
% hidratação do fermento (Starter hydration %) - 100%
% fermento/farinha total da massa (Starter as baker's %) - 40%
% hidratação da massa (Dough hydration %) - 68%
% sal/farinha total da massa (salt % relative to flour) - 1,5%

[Para outras quantidades mantendo as proporções usar a calculadora online]

PREPARAÇÃO
Numa taça grande (usei a da batedeira) colocar o fermento e diluir com a água.
Acrescentar o sal para que dissolva.
Juntar as farinhas e envolver até formar uma bola.
Deixar descansar 30min..

Amassar durante alguns minutos. Usei a batedeira com o gancho para amassar.

Voltar a colocar a massa na taça, cobrir com película aderente ou touca plástica ou colocar a taça dentro de uma saco plástico.
Guardar a massa no frigorífico para fazer a 1.ª fermentação, deixando levedar 12-18h.

Retirar a massa do frigorífico e amassar levemente.
Tender o pão e fazer a 2.ª fermentação dentro de uma taça ou banneton enfarinhado.
Deixar descansar tapado até duplicar de volume, cerca de 3h, em local morno.

Cozer em forno quente, 220ºC cerca de 1h.


NOTAS, MAS NÃO MENOS IMPORTANTES
- Para acompanhar passo a passo, seguir as fotos do Pão Sourdough de trigo e espelta.

terça-feira, 2 de maio de 2017

ÆBLESKIVER

Aebleskiver pronuncia-se "ér-bles-ki-ôar" e é uma das iguarias tradicionais da Dinamarca para as festas, mas também preparadas ao longo de todo o ano. Significa fatias de maçã, mas noutras línguas podem ser designadas por panquecas dinamarquesas.
A massa é mesmo de panquecas, mas cozinhada numa frigideira especial com cavidades onde se vai rodando a massa para esta adquirir a forma típica, arredondada.

A massa é fofa pela inclusão de fermento e de claras batidas em castelo. Na frigideira, ao serem rodadas nas cavidades, vão ganhando crosta mantendo-se ocas. As receitas mais antigas incluem cubos de maçã que seriam colocados no centro da massa, recheando-as. Atualmente, as æbleskiver, são servidas com compota de frutos silvestres, de mirtilo, de arandos ou mesmo de maçã, polvilhadas com açúcar em pó.
Há quem diga que a origem das æbleskiver remonta aos vikings que preparariam uma massa simples de ovos batidos, leite e farinha e que assariam, sobre o lume, nos seus escudos metálicos de batalha. Por apresentarem amolgadelas, a massa ficaria arredonda e quando virada ganharia uma forma semelhante à atual.

Já há algum tempo que andava a namorar uma destas frigideiras e ao ler "O livro do Hygge - o segredo dinamarquês para ser feliz" a receita vinha incluída. Achei que seria o momento ideal e após ter falado com a Mó, por coincidência ou não (there is no such thing), ela estava nesse dia na Dinamarca. M. e J. trouxeram-me a frigideira de ferro fundido :*
A preparação de æbleskiver é um dos momentos hygge (pronuncia-se huga) a par de tantos outros momentos como ouvir o crepitar da madeira a arder na lareira, o vestir a camisola de lã confortável que temos em casa e que por estar velha não sai à rua, o acender uma vela e contemplar a sua luz amarelada e as sombras que projeta em seu redor, ler um livro ou ver o filme preferido, beber um chá (provavelmente infusão) ou degustar um pouco de chocolate, o conversar com amigos, provavelmente em casa, a beber ou comer alguma coisa... ou sentir o cheiro do pão ou de um bolo acabado de sair do forno.
O manifesto Hygge resume: 1- Ambiente, baixar as luzes; 2- Presença, estar aqui e agora, desligar os telemóveis; 3- Prazer, café, chocolates, bolachas, bolos, guloseimas; 4- Igualdade, "nós" e não "eu", partilhar tarefas e tempo de antena; 5- Gratidão, pode muito bem não haver melhor do que isto; 6- Harmonia, isto não é nenhum concurso, já gostamos de ti, não é preciso gabarolices; 7- Conforto, vamos ficar à vontade, fazer uma pausa, a descontração é essencial; 8- Tréguas, nada de dramatismos, falamos de política noutro dia; 9- Convívio, criar relacionamentos e narrativas, "lembras-te daquela altura em que nós...?" ; e 10- Refúgio, este é um lugar de paz e segurança.

A primeira tentativa de fazer as æbleskiver com recheio de maçã, saiu até muito bem e acabou por ser um momento partilhado muito hygge em casa de amigos. A técnica das viragens e a quantidade e fluidez da massa foram mais aperfeiçoadas e hoje já saem muito redondinhas, sem aberturas!
Outras ideias já surgiram, quer para aromatizar a massa, quer como recheio, doce ou salgado. Outras sugestões se seguirão ;)

A receita que indico é ligeiramente alterada da do "O livro do Hygge", tendo acrescentado um pouco de manteiga à massa, como vi em tantas outras sugestões, e leitelho para fermentar melhor e a massa ficar mais arejada.

Fiz assim...

ÆBLESKIVER


INGREDIENTES
3 ovos (gemas e claras separadas)
450 ml de leitelho (ou leite + 1 colher (sopa) de vinagre)
250 g de farinha de trigo
1 colher (sopa) de açúcar (opcional)
1/4 colher (chá) de sal fino
1/2 colher (chá) de fermento em pó
3 colheres (sopa) de manteiga derretida

manteiga clarificada (para ir untando a frigideira)
maçã em cubos
compota
açúcar em pó

PREPARAÇÃO
Separar as gemas das claras.
Numa taça misturar as gemas com o açúcar.
Acrescentar o leite, farinha, o sal, o fermento e a manteiga derretida.
Misturar ligeiramente a massa e deixar repousar 30 minutos.

Bater as claras em castelo e envolver na massa.

Aquecer muito bem a frigideira e dispor uma pequena noz de manteiga clarificada em cada cavidade. Deixar fumegar um pouco e verter a massa em casa cavidade até cima.

No fim de cobrir todas as cavidades, começar por ordem, a levantar, com a ajuda de um espeto ou palito (ou agulha de crochet) a massa cerca de 90º. Repetir em todas as cavidades.
Com o espeto girar a massa a 90º mas lateralmente. Repetir em todas as cavidades.
Rechear com um cubo de maçã e girar a massa completando a esfera. Repetir em todas as cavidades.

Retirar para um prato ou grelha.
Servir quente com compota ou polvilhadas com a açúcar em pó.



NOTAS, MAS NÃO MENOS IMPORTANTES
- A massa pode ser aromatizada com raspa de limão ou mesmo um pouco de baunilha. Não querendo pode eliminar a colher de açúcar para maior contraste com as coberturas;
- Poderá visualizar este vídeo para se familiarizar com as viragens da massa na frigideira;
- Antes de usar a frigideira pela primeira vez, tal como noutras frigideiras de ferro fundido, é necessário lavar normalmente, secar bem com um pano e aquecendo-a e engordurar com óleo, azeite ou manteiga (usando papel de cozinha para espalhar a gordura e retirar o excesso) e aquecer bem a frigideira no fogão (foi o caso desta) ou no forno (1h a 180ºC voltada para baixo, no caso das convencionais) até fumegar, para que se tornem antiaderentes. É importante que estas frigideiras não voltem a ser lavadas com detergente, apenas com água quente e se necessário esfregar com um pouco de sal grosso para soltar algo que fique agarrado. Ficarão antiaderentes e quanto mais forem usadas melhor, serão utensílios para toda a vida e passarão para a próxima geração.